quinta-feira, 14 de maio de 2020

É vida, mas poderia ser...

É a vida, mas poderia se chamar liquidificador. Entramos nela e saímos completamente esmigalhados. Catando os pedacinhos para poder nos recompor.
Nem sei dizer quantas vezes me olhei e nem me reconheci. Procurei meus fragmentos para tentar encontrar aquela que, em essência, sempre fui. Sempre quis ser. Em alguns momentos, achei apenas uma fagulha de mim.
E nesse lampejo, vejo a luz que me proporcionou brilhar. Me volto para quem sempre foi porto e farol. E entendo que, por mais que a vida insista em dividir, uma cola invisível, mas tão forte que se pode pegar com as mãos, invariavelmente vai nos unir.
Nesse balé de partículas, não se sabe quem é uma, quem é outra. Pensamentos que fluem entre mentes conectadas. Sentimentos e quereres que se confundem. Onde eu começo e você termina. Até onde vai o que você me deu?
Daí que já não existem papeis. O colo, antes disponível, hoje é ofertado por quem antes se aconchegava. Palavras duras são ditas por serem aquilo que deve ser ouvido. Não importa de que boca venham. Nos confundimos ao mesmo tempo em que nos afirmamos.
Compartilhamos segredos, amigas e uma força que não sabemos de onde vem. Mas sabemos para onde vai. E vamos. Bruxarias e intuições, aprendemos a nos ouvir, respeitar e acreditar.
Não, você não é minha heroína. Minha guerreira. Minha mulher maravilha. Embora saibamos de todas as guerras e batalhas que travamos todos os dias. Você é mãe, mulher, profissional, cidadã, filha, que se cobra, foi e é cobrada por uma sociedade que nos exige demais, a ponto de nos sugar se a gente permitir. Não sou eu quem vai te atribuir ainda mais esse fardo.
E hoje, além de tudo, é avó. Mãe duas vezes, não é isso? O exercício da maternidade sob outra perspectiva. Certamente a melhor avó que uma neta poderá ter na vida. Que vocês transbordem de felicidade uma ao lado da outra, mesmo que esse ao lado não seja geograficamente tão perto.
E eu? Ah, se eu pudesse ter um, apenas um, desejo realizado nessa vida, seria de compartilhar, nem que fosse apenas um pouquinho, esse brilho, essa luz. É, eu poderia desejar também o seu talento, mas acho que aí só um gênio da lâmpada me concedendo 3 pedidos. E olhe que nem assim acho que dava conta...

terça-feira, 12 de maio de 2020

Tempos áridos

São tempos áridos. Buscamos, ali e aqui, migalhas de esperança para deixar os nossos sonhos de pé.
Despedaçamos relações. Conhecemos pessoas. Desconhecemos outras. Dor. Decepção. Frustração.
Medo do obscuro. E do que já é notório. Um passado que teima em se fazer presente. Um futuro que nos espreita de soslaio.
Fingimos ignorar, mas sabemos o que nos espera. Só temos receio que as cores que tingirão esse cenário sejam ainda mais sombrias do que imaginamos.
E aí nos agarramos a pequenos fragmentos de felicidade. A vida não pode parar. Temos de seguir: firmes, fortes e de mãos dadas. Temos de ser contagiosos. Agregar. Trazer para perto aqueles que estão na mesma sintonia. Chamar quem comunga das mesmas inquietações. A partir daí, ganhar, passo a passo, o nosso território de direitos e garantias.
Não, não, não nos cansaremos. Uns aos outros, nos alimentaremos de nossos anseios, de nossa revolta. Porque a capacidade de nos indignarmos é um de nossos tesouros.
O caminho é longo. Não tem fim. A peleja será uma constante. Deixaremos para as próximas gerações o exemplo de luta, do não se acomodar, do não aceitar.
Porque merecemos mais do que migalhas. Merecemos mais do que restos de direitos, sobras de garantias. Merecemos igualdade, justiça, honestidade. O fim do preconceito, do machismo, do racismo, da homofobia. O fim do abismo social. A extirpação dos currais eleitorais e de um congresso que não representa a nossa sociedade. Respeito aos povos indígenas e quilombolas. A diversidade de crenças e de pensamento. Que nossas crianças sejam ensinadas a pensar e conviver com o diferente. Respeito aos trabalhadores e trabalhadoras e seus direitos duramente conquistados. Preservação de nossas florestas.
Não querem nos dar? Não tem problema, vamos buscar.