domingo, 22 de dezembro de 2019

É Natal. E daí?


Tanta coisa para fazer, mas o que? Se não sei o que começar, como saber por onde iniciar?
Olho ao redor e não encontro sentido. Vejo rituais e não consigo lhes dar significado.
Falta algo. Preencher de sentimentos as palavras repetidas à exaustão.
Realmente pensamos isso tudo? Acreditamos de fato nesses clichês todos?
De fato desejamos realmente todas essas coisas boas?
Mesmo? Depois de um ano inteiro destilando ódio e rancor? Depois de xingamentos, ofensas e desrespeito? Isso sem falar no egoísmo, ma injustiça e indiferença.
Quando foi que o Natal se tornou sinônimo de varinha mágica? De repente, todo mundo virou solidário.
De repente, todo mundo se importa.
De repente, o mundo até ficou mais bonito.
E olha, nem vou falar nada sobre o dia 26, quando todos voltaremos ao normal, divididos por ideologias, princípios e crenças.
Sim, vamos fingir, apenas por uma noite, que não somos homofóbicos, racistas e machistas. Para que criar climão, né? Vamos fazer de conta que não foi golpe, para que constranger o tio que foi vestido de camisa da CBF para o Natal. Vamos acreditar que na árvore, dentre os presentes lindamente embrulhados, não estão a retirada de direitos e garantias e o ataque às camadas mais vulneráveis da população.
Finjamos. Porque o Natal pode ser todos os dias. A cada despertar temos o potencial de mudar uma vida, quissá o mundo. E isso pode ser feito com um pequeno gesto. Basta se importar. Basta querer fazer a diferença.
Mas queremos mesmo? Ou já já o Natal acaba e podemos ser quem sempre fomos?

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Aplicativos - 17/12/2015


Aplicativo para contar passos, marcar pedaladas, controlar a quantidade de copos de água, conversar, pagar contas, ler jornal, fazer compras, denunciar, editar fotos, vídeos, ensinar o caminho, fazer turismo, ouvir música...
Somos medidos, avaliados, monitorados, contados, classificados, julgados o tempo todo. Expomos e somos expostos. Viramos dados, números, meros portadores de características mais ou menos vendáveis, mais ou menos atrativas. Algorítimos controlam o que vemos, manipulam emoções, controlam nosso acesso.
Amizades Bot. Pic Sentimentos. Amor Rate.
Um app sai do ar e causa mais comoção do que um mar de lama que mata pessoas e arrasta vida e histórias por entre refugo de minérios. Do que um incêndio que ano após ano acaba com a fauna e flora de um paraíso ecológico. Do que a podridão que toma a nossa Câmara dos Deputados, Do que a violência a que foi submetida Fabíola. Do que a tentativa de golpe. Do que..
Onde está o aplicativo para medir a nossa humanidade? Qual o ícone do contador de generosidade? Em que exato momento a tela de smartphones e computadores transformou nosso sangue em pedras de gelo?
Há como voltar atrás? Seremos capazes ainda de olhar uns nos olhos dos outros e estabelecer empatia? Em que sermos humanos seja mais importantes do que recursos eletrônicos? Há algo que tenha o poder de nos fazer estender a mão a um igual? E a um diferente? Chegaremos ao dia que em aceitaremos as pessoas sem julgamentos baseados em nossos estereótipos e preconceitos? E que a vingança não seja um prato a se comer frio, mas algo indigesto a ser evitado? Haverá anti-vírus contra o egoísmo?
Ou estamos fadados a virar avatares de nós mesmos, emojis expressando emoções que na prática não existem, desejando bom dia boa tarde boa noite burocráticos e vazios?

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Pendências - 16/12/2017


Continuo cheia de pendências. Pequenas coisas fora do lugar e que vão me consumindo graça... Um chuveiro que pinga, uma torneira que vaza, uma tomada que falta, um exame que não consigo marcar, uma consulta que perdi o prazo para retornar...
Os provisórios que se tornam definitivos até que a gente nem lembre como era o plano original.
Sonhos empurrados com a barriga. O tempo, aquele que a gente nunca tem, passa rápido quando é para atropelar nossos desejos.
Dias, horas, nossas mãos não são capazes de segurá-los.
Em vez de correr, resto paralisada diante da minha incapacidade de domar o tempo e seus desdobramentos. Apenas observo as poeiras e teias de aranha dominarem minhas vontades, que vão se aninhando em algum lugar do meu peito, ao lado do choro engasgado.

domingo, 1 de dezembro de 2019

Adeus 2015


Começa dezembro e, com ele, o final de 2015. O ano que não quer acabar. O ano que quer durar uma eternidade, para multiplicar o horror e a barbárie a que fomos submetidos por meses a fio. Tortura mensal. Dia a dia, bombardeio de notícias das mais escabrosas. O EI é aqui?
Aliás, 2015 está se arrastando tanto que parece que nem a eleição de 2014 terminou. Democracia (mais do que nunca) ameaçada. Pobrezinha, tão jovem...
Falando em jovens, os nossos morrem como moscas, unicamente por serem negros. E pobres. Culpados. Mata primeiro, pergunta depois. É a nossa polícia. Para quem precisa...
E as nossas meninas? Violentadas, estupradas, tudo bem rapidinho, claro. Sequestradas aqui, ali, no Piauí ou na Nigéria.
E para proteger essas crianças e adolescentes o que fizemos? Reduzimos a maioridade penal. Porque criança boa é criança presa.
Em 2015, descobrimos que tudo é culpa do PT, que teve a brilhante ideia de inventar a corrupção. E então a classe média, branca, oriunda de escolas particulares, vestiu sua camisa falsificada da seleção brasileira, pegou a panela que até então não sabia onde ficava e foi para a rua cantar o hino, ops, protestar. Não sem antes dar um pulinho no cinema. Pagando meia, é claro.
Os EUA, pasmem, reconhecerem o casamento gay esse ano - coisa que o Brasil já havia feito de hoje.. O mundo se pintou com as cores do arco-íris. Ah, os ianques também fizeram as pazes com Cuba, quem diria?
Descobrimos (ohhh) que de fato o Cantareira estava sem água, mas a Paulista, ah essa sim tinha é muita! Mas, segundo Serra, o que não tinha era gente.
Aliás, coisa linda a Paulista, hein? Aquele mundo de ciclista, criança, adulto, velhinho, patinadores, deboístas fazendo a festa em uma avenida aberta para as pessoas. Pessoas!!!
E por falar em pessoas, 2015 foi o ano das mulheres e suas hashtags, que provocaram uma verdadeira revolução no mundo virtual e real. #meuprimeiroassedio e #meuamigosecreto colocaram as redes sociais em ebulição ao denunciar assédios sofridos por mulheres, muitas vezes quando ainda eram crianças, e entregar aquele cara que posa de defensor da igualdade de gênero, mas tem práticas machistas.
E como falar de 2015 e não falar do Enem, que vai reprovar muito machistinha que acha que a violência contra a mulher não existe, que tem mulher que gosta de apanhar e até merece? Simone de Beauvoir, que já tinha mitado no primeiro dia de prova, soltou gritinhos no túmulo.
Mas 2015, no fim das contas, está sendo um ano de mais perdas do que ganhos. O horror nos tira a paz, aqui ou do outro lado do mundo. Refugiados parecem não ter mais para onde ir. Lixo humano recusado por países que dão causa à guerra da qual fogem. Bombas. Lama. Arrasta e destrói tudo ao seu redor. Rastro de minérios que reforça a postura predatória e irresponsável de empresas e do do nosso país em relação às nossas riquezas e ao nosso povo. O mesmo povo que morre nas encostas quando vem a chuva, que sempre ultrapassa a média prevista para o período. Lama, água, fogo, terra arrasada, Chapada Diamantina em pó e cinzas, fruto de crimes e descaso
E ainda assim o povo tem força para se unir, fazer, ajudar, porque cada dia mais nos descobrimos fortes, valentes, aguerridos. Que o digam os jovens que estão lutando pela educação, pelo direito de estudar de forma digna, pelo direito ao diálogo. Não aceitamos mais qualquer coisa. Não engolimos mais qualquer desculpa.
Os últimos raios de sol de 2015 nos proporcionam um calor morno e confortável que nos dá alento para o que vem. Mas o horizonte está repleto de Cumulus Nimbus, prenúncio de mais tempestades.

Às vezes os dias vão exigindo tudo da gente: produtividade, energia, tempo, disposição, atenção. E a gente aceita que suguem tudo de nós. Porque precisamos. Porque não sabemos fazer de outro jeito. Eventualmente porque até queremos.
Não cabe tanta vida em tão poucas horas. Será vida mesmo?
Todas as atividades são combinadas. Trabalhar e comer. Beber e ler e-mail. Conversar e arrumar. Não se pode desperdiçar um minuto.
Dormir toma muito tempo. Vamos diminuir isso aí. Quatro horas está de bom tamanho. E o problema é seu se café não ajuda a te despertar.
E temos de tirar, desse mar de frustração, cansaço e descrença, boas energias e vibrações, porque existem pessoas que precisam disso para superar momentos difíceis. Sim, apesar de tudo, somos capazes de tirar pontinhos de luz de dentro de nós e enviá-los com muito amor.
É momento de se recolher. De dizer não. De se reconhecer limitada. Falha. Humana. De entender que a fortaleza apresenta rachaduras. E que está tudo bem perder o prumo, o eixo e não saber o que fazer. Que não tem problema não estar disponível. Ter raiva. Decepção. E perder o controle faz parte. Se perder também.
E ainda que demore para ser encontrado, o caminho estará lá. Ou não. Mas sempre podemos abrir novas trilhas, não é mesmo?

quinta-feira, 14 de novembro de 2019


Texto de 14/11/2015


As mortes multiplicam-se diante de nossos olhos estarrecidos. 40, 60, 80, 118... Paris é aqui. Também em nossa terra as mortes proliferam-se a cada esquina. Matadas. Morridas.
Violências crescentes e gratuitas. Aliás, gratuitas não. Custam o preço de um carro, um celular. Ou de uma escola. 94. Jovens sendo tratados como terroristas. Mulheres perdendo direito a seus corpos. Violências físicas e simbólicas. Levam muito mais do que bens materiais. Levam a paz.
E se de um lado do Atlântico temos atentados com bombas, do outro temos minério. Lama. Descaso. Irresponsabilidade. Água contaminada. E fogo. Velho conhecido. Rotineiro. Assassino.
A semana termina pior do que começou. Sem fé. Sem vez. Sem voz. Perdemos o rumo. Erramos a mão. Esse projeto está fadado ao fracasso. É uma questão de (pouco) tempo.
Violências crescentes e gratuitas. Aliás, gratuitas não. Custam o preço de um carro, um celular. Ou de uma escola. 94. Jovens sendo tratados como terroristas. Mulheres perdendo direito a seus corpos. Violências físicas e simbólicas. Levam muito mais do que bens materiais. Levam a paz.E se de um lado do Atlântico temos atentados com bombas, do outro temos minério. Lama. Descaso. Irresponsabilidade. Água contaminada. E fogo. Velho conhecido. Rotineiro. Assassino.A semana termina pior do que começou. Sem fé. Sem vez. Sem voz. Perdemos o rumo. Erramos a mão. Esse projeto está fadado ao fracasso. É uma questão de (pouco) tempo.

terça-feira, 27 de agosto de 2019


Texto de 27/08/2019

Compasso de espera. Horas, dias, semanas. Não, não, o tempo insiste em não passar. Ou será que ele está correndo mais rápido do que precisamos - e percebemos? A
 resposta apenas virá mais tarde. Espero que não tarde demais.
Não ter nada para fazer é angustiante. Claustrofóbico. Doloroso. Nos exige paciência, resiliência. É preciso viver. Seguir é preciso. 
Tudo como dantes no quartel de Abrantes. Vamos tocando a nossa existência, rotina, afazeres. Fingimos? Conversamos amenidades, tratamos de pequenos acontecimentos. É, a gente vai levando.
Fazemos prognósticos imaginários. Traçamos ações e reações. Criamos falas para cada situação.
Mas a verdade é que não temos a mínima ideia do que vem por aí. Porque não se parece com nada que já vivemos. E a vivência dos outros nos serve de quase nada.
O tic tac fictício é nosso carrasco e professor. De um jeito ou e outro, nos mantêm acorrentados ao seu passar modorrento. De um lado nos tira o sono, de outros nos ensina que precismos encontrar novos jeitos para sorrir.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019


Texto de 05/08/2018

Eu não sou uma pessoa de muitos amigos. Talvez porque não cultive amizades do jeito certo. Talvez porque meu jeito afaste as pessoas. Pode ser que não seja uma pessoa divertida, legal ou interessante o bastante. Ou talvez porque simplesmente as pessoas não se sintam à vontade de conversar, desabafar, se abrir comigo. Enfim.
E se eu tenho poucos amigos, cada dia tenho menos deles que estão por perto fisicamente. Para sempre, por tempo determinado ou sabe-se lá por quanto tempo
Dizem que amigo é coisa para se guardar. No fim das contas, acho que guardar não é exatamente o que devemos fazer. Amigo é para desfrutar, conviver, aproveitar. Essa sensação que as redes sociais nos dão, de que eles estão sempre por perto, só deveria servir quando os amigos estão de fato longe. Porque, na prática, nós apenas adiamos, enrolamos, vamos marcar, vamos mesmo. E nunca marcamos. "Nossa, quando a gente se encontra, parece que nunca deixou de se ver." "Fulana é daquelas amigas que eu sei que quando precisar posso contar com ela mesmo que a gente fique milênios sem se ver."
Não, gente, não... Por que deixamos tanta distância se criar entre nós? Por que não cultivamos o suficiente as nossas relações? Não há whatsapp que substitua um abraço. Nenhuma chamada em vídeo é igual ao olho no olho. Uma reação "amei" no Facebook não se compara a um colo de verdade. 
Se, de um lado, vejo pessoas que parecem não ligar, por outro lado, vejo amigos e amigas imersos em suas rotinas, problemas e complicações e me pergunto quem sou eu para levar mais questões. Aí engulo meus problemas, me engasgo com minhas dores, sufoco minhas aflições. E acrescento mais alguns metros no espaço que nos separa.
Na prática, o que acontece é que tenho ficado um pouco cansada de cobrar afeto. De tentar me aproximar. De resgatar amizades que foram se esgarçando. Daí penso em deixar pra lá, largar de mão, esperar que quem quiser, que me procure, e se não procurou, é porque não ligava muito. No instante seguinte, me arrependo e penso que devo fazer a minha parte. 
Seguimos entoando, no automático, uma canção que não nos diz nada, simplesmente pela absoluta incapacidade de deixar a roda. Nessa ciranda de cantiga triste, apesar das mãos dadas, giramos giramos e ninguém sai do lugar.

quarta-feira, 24 de julho de 2019




Texto de 23/07/2017
A noite passa devagar, apesar das gargalhadas que a recheiam com a mesma competência que as cebolas caramelizadas e o krem rechearam nossos hambúrgueres. Sim, h
ambúrgueres, como aprendemos há anos na propaganda da rede de fast food do palhaço. Mas aqui o katchup é caseiro, e dessa vez não é de goiabada.
Não são nem 22h, mas a noite foi tão generosa quanto a porção de batata frita de forno que comemos de forma quase instantânea.
Ah, a mesa que parece não caber todo mundo, mas se ajeitar direitinho todo mundo come. E ri. E revela confidências. E troca olhares. E chamados. Tudo normal.
O papo segue firme enquanto brincamos de bobinho e falamos amenidades e abobrinhas com entusiasmo. Polenta. 
Circulamos por todos os assuntos, mas a noite pede leveza. Talvez porque a gente já esteja um pouco cansado de carregar tanta atrocidade no coração. Nossos sorrisos precisam se conectar. E se unem numa vibração que segue o compasso de Kaoma. Por que é que você foi embora sem dizer pelo menos adeus? Rum bum bum bum bum bum bum.
Já vão? Avisem quando chegarem. Voltem sempre. A cama está disponível.

quarta-feira, 10 de julho de 2019


Texto de 10/07/2016
Sempre é tempo de plantar e colher. Tempo de saber que a semente pode vingar ou simplesmente recusar-se a brotar. De ter paciência para esperar a germinação e v
er o caule romper a terra e se revelar.
Plantar é vida. E ensina muito sobre ela. Sobre as consequências de nossas ações. Sobre fazer as coisas acontecerem. Sobre não ter pleno controle sobre tudo. Sobre lidar com adversidades.
Mexer com a terra é mais do que jogar um bando de sementes em um vaso e desejar que nasçam. Porque é preciso humildade para entender que fazemos parte dessa cadeia. Nutrimos as plantas e elas nos nutrem, e não falo apenas em um sentido alimentar. Sim, as plantas interferem em nossas sensações, mudam o aspecto de nosso ambiente, trazem conforto e bem estar. E sim, algumas delas também nos alimentam. E elas se alimentam. Se isso não é um círculo virtuoso, então não sei mais o que é.
Hoje senti que precisava meter a mão na terra. Porque precisava de uma lufada de vida em minha vida; precisava acreditar no nascimento e no renascimento; precisava lembrar que a semente, para brotar, tem de romper a sua casa e superar a terra, que também lhe sustentação e nutrientes, e que lhe lembra de onde ela veio.
Assim somos nós. Nascemos muitas e muitas vezes ao longo de nossa vida. Somos sempre semente, lutando para germinar, crescer, florescer. E dar frutos. Sim, espalhar o bem é uma forma de dar frutos.
É tempo de plantar para semear a existência, de preparar a terra e fazer brotar o amor. Tempo de saber esperar o momento certo para a colheita. E de saber que, se nada nascer, outras sementes virão e renovarão a nossa fé no ciclo perfeito da vida.

terça-feira, 9 de julho de 2019



Texto de 09/07/2017

Eu uso bicicleta com regularidade há quase 4 anos. Pouco tempo, se formos observar pessoas que estão há muito mais tempo no rolê.
Comecei pedalando com as laranjinhas, fazia o percurso da ciclofaixa de lazer, comecei a me aventurar por outras paragens, tomei gosto, fiz viagem, desafio e o escambau.
Por motivos diversos, que não cabem aqui, fui deixando o pedal esportivo, os grupos, a busca por resultados, QOM, Strava etc... Acabei por ficar mais concentrada naquele pedalzin de leve, sem pressão, sem amarras.
Nada contra o pedal esportivo, em grupos etc. Acho ótimo que exista e que existam muitos! Que Salvador tenha tantos grupos quanto reza a lenda urbana sobre as nossas igrejas, uma para cada dia do ano. Esse modelo só não serve mais para mim.
Daí que passei a pedalar mais por deslocamento mesmo. Pequenas idas aqui e ali, passeios eventuais na orla... E então chega o bendito, o abençoado metrô. Glória, glória, aleluia. Depois de um ano me sentindo encastelada, volto a ser livre nos meus deslocamentos.
E vem a realização de um sonho, a minha dobrável, depois de um périplo para a sua saída de Goiás e chegada à Bahia.
Esses meus deslocamentos são curtos, rápidos e combinados com outros modais, como metrô e elevador. Vou ao trabalho, à casa de minha mãe sem depender de táxi ou ônibus para chegar à estação ou da estação para casa.
Onde quero chegar com esse blá blá blá todo? Que usar a bicicleta como meio de transporte é diferente de usar a bicicleta como lazer ou como esporte. Bem diferente. E as pessoas precisam entender isso. E respeitar quem faz isso. Eu não uso capacete para esses deslocamentos. Essa é uma opção. Faço essa escolha com consciência - inclusive política - e ponderação.
NÃO SOU SUICIDA. NÃO SOU INCONSEQUENTE. Exijo respeito com as decisões que tomo sobre a minha vida. 
A gente corre o risco de ser atingido por uma bala perdida e nem por isso recomendo que as pessoas andem com colete à prova de bala. As pessoas podem sofrer um ataque cardíaco e nem por isso mando que carreguem um desfibrilador na bolsa. Meus vizinhos têm grande chance de serem picados por cobras ou escorpiões aqui nas redondezas, mas nem por isso buzino em suas casas para dizer que calcem botas de cano longo.
Eu posso cair da bicicleta? Posso ser derrubada da bike? Sim, posso. Já aconteceu? Até hoje não. Mas eu não acho que o capacete é a minha tábua de salvação e não vou aderir à uma lógica de que a rua é perigosa e que por isso eu preciso me municiar de todos os equipamentos possíveis e imagináveis para me precaver de qualquer risco.
Você usa capacete? Se sente seguro? Se sente bem? Confortável? Ótimo, é a sua escolha. Você nunca vai me ouvir dizer que tire o capacete, que ele é um boné de isopor que não serve para nada.
Então, se eu não te digo para tirar o capacete, por que você se acha no direito de me mandar usar? Por que se acha no dever de, "preocupado" com a minha saúde e a minha integridade física, dizer que faça uso de um equipamento de que deliberadamente escolhi não utilizar? Por que se acha no direito de rogar praga para que eu caia e bata a cabeça apenas para ter a satisfação de abrir a boca e dizer: "viu, eu avisei"?
Como se a culpa fosse minha se eu for atropelada por um carro. Se eu for atingida por uma porta que alguém abriu em olhar. Se eu escorregar por causa de areia na ciclovia. Se eu perder o controle da bicicleta por causa de um defeito no asfalto. Se a minha roda ficar presa numa boca de lobo. Se um ônibus passar muito próximo de mim e me desequilibrar.
É, porque a culpa sempre sera minha. Da vítima. Daquela que escolheu pedalar. E daquela que, ao usar a bicicleta, escolheu lutar por uma cidade mais humana, mais gentil, mais consciente. Mas que não encontra eco naqueles que dividem as ruas comigo. Que preferem fazer prevalecer uma opinião do que juntar forças e combater a verdadeira ameaça.
Uma pena. Juntos seríamos tão fortes...