sábado, 8 de março de 2014

O dia é nosso, mas o presente é de...

Dispenso as flores, os presentes e os cartões. Passo batido por todos os emails promocionais que estou recebendo hoje. Troco todos os "Feliz Dia da Mulher" e os "Parabéns pelo seu dia" por um mundo onde eu não precise me esconder sob roupas para tentar normalmente em vão não ser tratada como um pedaço de carne. Onde não haja uma estatística de que 70% das mulheres sofreram algum tipo de violência ao longo de sua vida. Ou de que 40% a 70% dos homicídios de mulheres foram cometidos por seus parceiros. Ou de que uma em cada cinco mulheres sofreu ou sofrerá uma tentativa de estupro no decorrer de sua vida. Ou ainda de que 80% das vítimas de tráfico de pessoas sejam mulheres. Para não precisar ir muito longe, quero um país em que o feminicídio não atinja a absurda marca de 5,8 mortes por 100.000 mulheres. Em que a Lei Maria da Penha atinja a sua finalidade e consiga reduzir, de fato, o número de mortes, coisa que hoje não acontece.
E deixo aqui uma música e um poema, uma homenagem a nós, que somos mulheres, que nos tornamos mulheres ou que escolhemos ser mulheres. A nós, que vivemos equilibrando papeis, sendo uma, mas sendo várias, para dar conta de tudo que nos cabe, ou que tomamos para gente, porque achamos que somente nós conseguimos dar conta. A maioria das vezes é verdade.

Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado para mulher
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem
sem precisar mentir
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Adélia Prado



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