quarta-feira, 13 de junho de 2012

Não é o que você disse, mas a forma como disse...

Já ouvi e falei muitas vezes essa frase. Num apego quase irracional ao tom e às expressões faciais, fingimos aceitar bem aquilo que nos foi dito. A realidade é um pouco diferente.
A realidade esconde que, por trás de palavras duras, por vezes até grosseiras, normalmente está a preocupação de alguém que não encontrou outra forma de atingir seu objetivo, que é ajudar.
A pegunta é: quem nos deu o direito de machucar em nome de ajuda? Quem nos permitiu ultrapassar a linha tênue da dureza e ofender aqueles que amamos? Mais: quem decide o que é ajudar?
Quando nos damos conta, já ofendemos, já magoamos, já machucamos, e pior, provavelmente nem ajudamos.
E fica a ressaca moral, remoendo o que deveríamos ter falado de diferente, o ponto exato em que ultrapassamos o limite e atingimos em cheio um amor, uma amizade.
No fim, o que resta? Ter a humildade de pedir desculpas e torcer para que elas sejam aceitas. E rezar para que a pessoa entenda que fizemos o que fizemos com a melhor das intenções apesar dessa frase soar horrível e cafona.



O Poço

Cais, às vezes, afundas
em teu fosso de silêncio,
em teu abismo de orgulhosa cólera,
e mal consegues
voltar, trazendo restos
do que achaste
pelas profunduras da tua existência.

Meu amor, o que encontras
em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos,
rancorosa e ferida?

Não acharás, amor,
no poço em que cais
o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado,
um beijo mais profundo que esse abismo.

Não me temas, não caias
de novo em teu rancor.
Sacode a minha palavra que te veio ferir
e deixa que ela voe pela janela aberta.
Ela voltará a ferir-me
sem que tu a dirijas,
porque foi carregada com um instante duro
e esse instante será desarmado em meu peito.

Radiosa me sorri
se minha boca fere.
Não sou um pastor doce
como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo
terras, vento e espinhos das montanhas.

Dá-me amor, me sorri
e me ajuda a ser bom.
Não te firas em mim, seria inútil,
não me firas a mim porque te feres.

Pablo Neruda 


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